terça-feira, 5 de março de 2019

Iniciamos a Quaresma com as Cinzas


E depressa chegámos a este tempo favorável, a este dia da salvação, que em especial, nesta Quaresma, o Senhor nos quer oferecer, com abundância. A Palavra de Deus toca a rebate, e parece rasgar o nosso coração, com três apelos de urgência, que se tornam indicações concretas, para o caminho que nos levará até à Páscoa.

1. O primeiro apelo, na boca do profeta Joel, é o da conversão: “Convertei-vos ao Senhor, vosso Deus”. Ninguém se julgue fora deste convite! Ele estende-se a todo o Povo de Deus, aos anciãos, aos jovens, às crianças, aos casais. Porque todos pecámos. Todos falhámos o alvo da santidade! Por isso, precisamos todos, e muito, de aprender a chorar os nossos pecados, de pedir a Deus o dom das lágrimas, a graça de nos sentirmos pecadores, para alcançarmos o Seu perdão. Só teremos dor do nosso pecado, que é causa da nossa miséria, se tivermos confiança neste Amor de Deus “clemente e compassivo, paciente e misericordioso”. Converter-se é deixarmo-nos abraçar, tocar e envolver pela Sua misericórdia, para sermos e nos tornarmos “misericordiosos, como o Pai”.

2. O segundo apelo vem do apóstolo São Paulo, e concretiza o primeiro: «Reconciliai-vos com Deus». “Ponhamos novamente o sacramento da Reconciliação no centro, porque este permite-nos tocar sensivelmente a misericórdia do Pai”. É preciso regressar, de modo renovado, e sem preconceito, à confissão. Não basta arrepender-se e pedir perdão, como às vezes de ouve dizer: “confesso-me diretamente a Deus”. Procuremos, sem medo, o Sacramento da Reconciliação, que não é câmara de tortura, mas porta da misericórdia; que não é lavandaria, para branquear os pecados, mas é lugar de cura e remédio, para as nossas feridas. «A Quaresma seja vivida como tempo forte para celebrar e experimentar a misericórdia de Deus».

3. O terceiro apelo é inspirado no evangelho: «Tende cuidado em não praticar as vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles». Este é, pois, o tempo das obras de misericórdia, que é preciso praticar, sem dar nas vistas, sem pôr o ar sombrio de quem faz muito sacrifício, mas de cabeça perfumada e cara lavada. Não deixemos que passe em vão este tempo favorável! Peçamos a Deus que nos ajude a realizar um caminho de verdadeira conversão. Abandonemos o egoísmo, o olhar fixo em nós mesmos, e voltemo-nos para a Páscoa de Jesus; façamos-nos próximo dos irmãos e irmãs em dificuldade, partilhando com eles os nossos bens espirituais e materiais.»

O Papa Francisco lembra que a Quaresma «chama os cristãos a encarnarem, de forma mais intensa e concreta, o mistério pascal na sua vida pessoal, familiar e social, particularmente através do jejum, da oração e da esmola». Jejuar, consiste em modificar a atitude pessoal «para com os outros e as criaturas», transitando da «tentação de “devorar” tudo» para a «capacidade de sofrer por amor, que pode preencher o vazio do coração». «Orar, para saber renunciar à idolatria e à autossuficiência do nosso eu, e nos declararmos necessitados do Senhor e da sua misericórdia», aponta. E «dar esmola, para sair da insensatez de viver e acumular tudo» para si próprio, com a «ilusão» de assegurar um futuro que não pertence a cada ser humano, por melhor que julgue prepará-lo, mas a Deus. Com estas três práticas, o ser humano pode «reencontrar a alegria do projeto que Deus colocou na criação e no coração»; ou seja: «O projeto de amá-lo a Ele, aos nossos irmãos e ao mundo inteiro, encontrando neste amor a verdadeira felicidade».
As cinzas que vamos receber são uma imagem eloquente e um sinal expressivo da fragilidade humana e da futilidade dos bens deste mundo. Mas mais do que isso, que poderia significar uma visão meramente negativa dos sinais litúrgicos e do seu simbolismo, este gesto ritual das cinzas constitui um apelo à fé no evangelho e à conversão do coração: “Convertei-vos e acreditai no evangelho”. 
Estamos certos de que, com este gesto tão simples e tão antigo, o Senhor nosso Deus fortalece com a sua graça os nossos propósitos de caminho ao longo deste tempo da Quaresma para que renasçamos para uma vida nova.
Este ritual das cinzas, com que iniciamos a Quaresma, que nos lembra o pó inerte da terra, faz-nos olhar já no horizonte distante da vida nova da graça em Jesus Cristo, tão bem simbolizada nas águas regeneradoras com que seremos aspergidos na noite da Vigília pascal e no lume novo que nessa mesma noite aí surge para nos iluminar e dar vida. Estes quarenta dias de Quaresma, que hoje começamos, são verdadeiros dias jubilares: dias jubilares de fé, de caridade, de profecia, de esperança e de bênção, que cada um de nós saberá transformar em horas de oração, de penitência, de conversão, de renúncia e de partilha. 

Vive esta Quaresma como verdadeira hora de conversão!

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